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Subject: Uma derrota histórica (por Fernando Rosas)


Author:
Bloquista convicto
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Date Posted: 13:03:51 07/09/04 Fri

Uma Derrota Histórica
De Fernando Rosas
Por FERNANDO ROSAS

Público, Quarta-feira, 23 de Junho de 2004

Já foi dito, mas convirá ter isso particularmente em conta nos cálculos e conjecturas políticas do futuro próximo: as eleições europeias do passado dia 13 de Junho traduziram-se na maior derrota de toda a história eleitoral das direitas portuguesas desde que está em vigor a Constituição de 1976.

Não se trata de uma afirmação gratuita. O que se quer dizer é isto: a coligação PSD-PP, comparando com as eleições europeias de 1999 (a comparação mais benévola), perde 230 mil votos (mais de 20 por cento do seu eleitorado naquele ano), dois eurodeputados (despesa feita, como se sabe, só pelo PSD) e seis pontos percentuais.

Se o termo de comparação for as eleições legislativas de 2002, o descalabro assume as suas verdadeiras proporções. Naquele ano, o PSD e o PP tinham totalizado mais de 2 milhões e 600 mil votos, ou seja, 49 por cento de todos os votos expressos. Pouco mais de dois anos depois de governação da direita e da extrema-direita, a coligação perde: para cima de um milhão e meio de votos; cerca de dois terços dos eleitores que lhe haviam dado a maioria em 2002; 16 pontos percentuais e fica sem a maioria em 99 concelhos do país. É uma hecatombe cujo significado é incontornável: uma inequívoca condenação por parte de dois terços do eleitorado que votou, mas também por largo número dos que se resolveram abster, das políticas neoliberais, anti-sociais e recessivas levadas à prática neste biénio negro pelo Governo do PSD-PP. Um "não" rotundo e um protesto veemente à governação que conduziu ao meio milhão de desempregados, à paralisação da economia, à liquidação privatista dos sistemas públicos de saúde e segurança social, ao estrangulamento do ensino público e da investigação, à subserviência que associa o país, através da presença da GNR, à criminosa guerra de ocupação do Iraque. Foi contra isso, contra o biénio negro do poder das direitas que os eleitores votaram nas eleições europeias de 13 de Junho. Não vale a pena iludir as questões.

Essa derrota histórica, como é sabido, não retira, formalmente, juridicamente, legitimidade funcional ao PSD e ao PP para governarem. Mas politicamente, a não haver, como já se anunciou que não haverá, mudanças drásticas na estratégia da governação, a legitimidade para a prosseguir está mortalmente comprometida - isto é, ao insistir nas suas políticas, a direita sabe que actua contra a vontade expressa do eleitorado, que, tendo um mandato abstracto para governar, não tem mandato popular concreto para governar no poder desta maneira. Saber se a direita tem força política, coesão interna e arte para se aguentar no poder por mais dois anos nesta situação é o principal problema que se coloca à saída destas eleições. Depende dela e depende da capacidade das esquerdas e de todas as forças sociais e políticas de resistência e protesto tirarem disto as conclusões que se impõem em termos de iniciativa política. Seja como for, é um Governo sem apoio popular, politicamente enfraquecido e gravemente ferido na sua coesão interna o que sobrevive às eleições europeias. Veremos se dura e quanto dura.

O PS, sem registar a retumbante vitória que por aí se anunciou, é, sem dúvida, o principal beneficiário do desastre eleitoral da direita. Face às eleições europeias de 1999 cresce 20 mil votos e 1,5 por cento, sem ganho de qualquer eurodeputado, ou seja, consolida a posição anterior. O resultado é menos brilhante se comparado com as legislativas de 2002 (um dos piores resultados, assinale-se, da história eleitoral do PS): recupera sete pontos percentuais, reganha a maioria em 99 concelhos, mas perde 545 mil votos, cerca de um quarto dos que nele votaram há dois anos, que fogem para a abstenção ou para o apoio a outros partidos. Mas é verdade que os socialistas são os imediatos ganhadores desta importante alteração da correlação de forças que se verifica na vida política do país. Já a sua capacidade para dela aproveitarem está em aberto, quando à saída de uma peleja vitoriosa, imediatamente se abre a luta interna pela liderança do partido ou recomeçam os ziguezagues face à presença da GNR no Iraque.

Os dirigentes do PS terão de escolher se querem salvar o Governo das direitas através de entendimentos de bloco central, com ele contrariando o voto expresso de boa parte do seu próprio eleitorado, ou se pretendem participar no campo social e político de alternativa à governação da direita para que os resultados de 13 de Junho parecem indicar. Também, neste aspecto, tudo está em aberto.

O PCP suspirou de alívio com a não confirmação de uma perda acentuada de votos. Teve, como vem tendo paulatinamente de eleição em eleição, uma nova queda mas que adia as piores previsões, o que pareceu chegar para satisfazer os seus dirigentes. Quanto às europeias de 1999, o PC recua 1,3 pontos percentuais e perde 49 mil votos (15 por cento da sua base eleitoral), conseguindo, todavia, manter o segundo deputado. Mas a descida é mais acentuada se se comparar com as legislativas de 2002: o PCP perde 70 mil votos, ou seja, cerca de 20 por cento da sua base eleitoral de então, também ela se deslocando para outros partidos ou para a abstenção. Se os resultados do PCP nas eleições de 13 de Junho fossem obtidos a contracorrente ou pontualmente, eles poderiam ser encarados com mais tranquilidade pelos seus dirigentes do que no contexto em que se verificam, isto é, de uma tendência para a perda continuada e ininterrupta de votos.

A este respeito merece atenção a leitura comparativa de alguns resultados do PCP e do Bloco de Esquerda. O BE, pela primeira vez, ultrapassa o PCP em sete capitais de distrito, em 73 concelhos rurais e urbanos e em inúmeras freguesias das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto (o BE ultrapassa o PCP em 21 freguesias do concelho de Lisboa), onde, com escassa diferença, os dois partidos emergem destas eleições como força de dimensão eleitoral comparável.

O Bloco de Esquerda regista a melhor votação desde que se fundou, há uns curtos cinco anos e pouco: elege o seu primeiro eurodeputado, 4,9 por cento e 168 mil votos. A comparação dos presentes resultados com os das europeias de 1999 dá-lhe mais 105 mil votos (quase triplica) e 3,1 por cento de acréscimo. Mais significativa (uma vez que as europeias de 99 eram as primeiras eleições a que o BE, recém-fundado, concorria, naturalmente com escassos resultados) é a comparação com as legislativas de 2002. Recolhe, neste caso, mais 15 mil votos, um aumento de quase 10 por cento relativamente aos 153 mil então obtidos: é o único partido que regista um aumento em termos absolutos relativamente às legislativas, o que pode significar que só ele conseguiu contrariar com sucesso a abstenção.

Uma leitura mais detalhada dos resultados do BE regista uma progressão nacionalmente equilibrada. Como padrão aproximado, em regra, face às europeias de 1999, triplica a votação nos concelhos rurais e duplica nas freguesias urbanas. Nos concelhos urbanos, o crescimento no eleitorado popular é acompanhado pela manutenção da capacidade de expansão nas secções de voto de novos eleitores. O BE parece, assim, fixar um núcleo duro de eleitorado fiel, sem prejuízo de captar novos votos, designadamente em novos sectores do eleitorado popular urbano e na juventude. Para todos os efeitos, e falando em termos eleitorais, o Bloco parece ter logrado ultrapassar com sucesso a fase de grupo político mais vulnerável à lógica do "voto útil", para emergir como força política de alternativa, assente na fidelização de um sector estável do eleitorado. Resta saber da sua capacidade futura de alargar essa área de voto estável, à custa do voto conjuntural e flutuante - o que, provavelmente, tem a ver com coisas, causas, situações e intervenções mais vastas e, frequentemente, mais importantes que a estrita lógica eleitoral, ainda que com importantes reflexos nela.

Tudo visto, talvez não seja exagerado concluir que as eleições de 13 de Junho passado, em termos dos seus efeitos internos, evidenciaram duas realidades novas. Por um lado, a pesada derrota da aliança da direita no poder. Pela sua profundidade, ela altera a correlação de forças existente e deixa em aberto o futuro do Governo e da coligação. Por outro, o crescimento seguro e sustentado do BE como nova força de esquerda e de alternativa. São grandes as expectativas e maiores ainda as responsabilidades que essa afirmação comporta. Estou em crer que ninguém lhes virará a cara.

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