Author:
José Manuel Fernandes
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Date Posted: 11/03/05 22:47:07
In reply to:
Fernando Penim Redondo
's message, "Entrevista com Manuel Castells" on 10/03/05 13:09:41
A mensagem de Manuel Castells não é apenas de que precisamos de mais inovação: é que para conseguirmos estimular a inovação precisamos de mudar hábitos e comportamentos de uma forma tão radical que isso corresponde a encontrar um novo paradigma cultural
A entrevista que hoje publicamos com o sociólogo Manuel Castells não é susceptível de gerar grandes optimismos. Mais: multiplica as inquietações.
O facto de Castells, autor do mais completo estudo sobre as sociedades em rede, fazer a sua própria autocrítica pela sua quota-parte no fracasso, até ao momento, da estratégia de Lisboa e apontar novos caminhos é um exercício de lucidez que nos deve inspirar. Não para desistir de uma estratégia de desenvolvimento que é a única viável para mantermos níveis elevados de rendimento e bem-estar, mas para corrigir o que necessita de ser corrigido.
Para o sociólogo, nas sociedades europeias - ao contrário do que se passa nos Estados Unidos - é necessário que o sector público desempenhe um papel central na mudança dos modelos de desenvolvimento. O problema é que isso não deve ser entendido como sinónimo de estatismo. Por outras palavras: na Europa não existe na sociedade civil e no tecido empresarial o mesmo dinamismo que encontramos nos EUA e, por isso, é necessário um empurrão do sector público e da administração; porém, o sector público e a administração não são capazes de produzir inovação, pelo que o seu papel não deve ser fazer, antes "fazer fazer".
Dizer isto em países como Portugal, sugerir que é este o caminho, é quase sinónimo de pedir o impossível. Primeiro, porque a administração pública que o sociólogo diz ser necessária é a antítese da que temos. Enquanto a nossa administração se baseia no secretismo, nas capelinhas, na desconfiança face aos cidadãos, na incapacidade de partilhar informação no seu interior, é pesada e burocrática, a que Castells sugere deve funcionar de forma transversal, ser transparente e acreditar nos cidadãos e nas suas capacidades.
Depois, porque a nossa sociedade civil vive à babugem do Estado, tem pouca ou nenhuma capacidade de arriscar em projectos novos, relaciona-se com base em contratos blindados e leis labirínticas e reage mais depressa por inveja do sucesso do que por prazer de o inventar.
"Para os inovadores o trabalho é um prazer, onde o jogo e a inovação se misturam", disse-nos. "Ganhar dinheiro é a última das preocupações." Para os portugueses é ao contrário: o que conta é ganhar dinheiro e ter segurança no emprego, ter uma casa e carro à porta. Ou seja, o que se deve esperar de uma sociedade que ainda mantém uma mentalidade rural e aldeã, que não valoriza a educação, onde a ética do trabalho caiu em descrédito e se é avesso a qualquer risco.
Num país pequeno, como Portugal, Castells considera que se deve apostar nas pequenas e médias empresas, às quais falta contudo massa crítica, algo que só podem obter cooperando. Ora, acrescenta, "não é fácil fazê-lo numa cultura de desconfiança". Mas também não é possível fazê-lo por via da intervenção estatal, pois não é com "o Estado a produzir e a mandar" que progridem as sociedades baseadas na inovação e que funcionam em rede. Daí que, se quisermos inverter o nosso ciclo de decadência, temos não só de reformar o Estado e a administração como de assumir que não serão estes a salvar-nos. Teremos de ser nós, enfrentando um problema sempre ausente do debate político: o de saber como mudamos de paradigma cultural, como vencemos os atavismos, os receios e os bloqueios culturais provincianos e retrógrados deste país de lamurientos "velhos do Restelo".
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