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Subject: Indústria nos cárceres dos EUA


Author:
PERPÉTUA
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Date Posted: 30/03/06 13:59:40




Indústria nos cárceres dos EUA: negócio lucrativo ou nova forma de escravidão?

OS organismos de direitos humanos, políticos e sociais estão denunciando o que eles chamam de uma nova forma de exploração desumana nos Estados Unidos, onde asseguram que há uma população carcerária de cerca de 2 milhões e cuja maioria, negros e hispânicos, trabalha nas indústrias por uns tostões. Para os magnatas que investiram nestas indústrias, o achado é como um tesouro. Ali não fazem greves, não têm que pagar seguro de desemprego, férias, nem trabalho compensativo. Os presos trabalham a tempo integral, não têm dificuldades para chegar a tempo ao trabalho ou faltar por algum problema familiar. Ainda mais, se não lhes convêm o pagamento de 25 centavos por hora e se recusam a trabalhar, são encerrados em celas solitárias.

Há aproximadamente no país dois milhões de réus nos cárceres estaduais, federais e privados. Segundo o California Prison Focus, “nenhuma sociedade na história da humanidade jamais encarcerou tantos cidadãos”. As cifras apontam que os EUA encarceraram mais pessoas que um país qualquer: mais meio milhão que a China, país que tem mais cinco vezes a população dos Estados Unidos. As estatísticas indicam que os EUA tem 25% de todos os presos do mundo, mas apenas 5% da população mundial. A população carcerária aumentou de 300 mil, em 1972, para 2 milhões, em 2000. Em 1990, era de um milhão. Há dez anos, somente havia cinco cárceres privados no país com 2 mil reclusos. Presentemente, há 100, com 62 mil presos. Espera-se que para a próxima década o número de réus atinja 360 mil, segundo informes. O que aconteceu nestes dez últimos anos? Por que aumentou o número de presos? “A contratação privada de reclusos para trabalhar fomenta incentivos para encarcerar pessoas. As cadeias dependem dessas rendas. Os acionistas de corporações que lucram com o trabalho dos presos manobram para lhes alargar as penas e estender o tempo de trabalho.

O sistema nutre-se a si próprio”, salienta um estudo do Partido Trabalhista Progressista que acusa a Indústria de Cárceres de ser “uma cópia da Alemanha nazista em relação ao trabalho escravagista forçado e aos campos de concentração”.

O Complexo Industrial de Cárceres é uma das indústrias de maior crescimento nos EUA e seus investimentos estão no Wall Street.

“Esta indústria multimilionária tem suas exposições comerciais, convenções, sites, catálogos, para fazer pedidos por correio e internet. Além do mais, faz campanhas diretas de anúncios, companhias de arquitetura, companhias de construção, casas de investidores de Wall Street, companhias de serviço de encanadores, companhias provedoras de alimentos, de coletes à prova de bala, celas acolchoadas de diversas cores”. Segundo Left Business Observer, a Indústria Federal de Cárceres produz 100% dos capacetes militares, porta-munições, coletes blindados, carteiras de identidade, camisas e calças, barracas e coldres, cantis. Além do material de guerra, os trabalhadores das penitenciárias produzem 98% do mercado interno para serviços de montagem de aparelhos, 93% das pinturas e pincéis dos pintores, 92% dos serviços de montagem de fogões, 46% das armaduras, 36% dos utensílios domésticos, 30% dos fones de ouvido e alto-falantes, 21% da mobília de escritório. Partes de aviões, material médico e muito mais: até criação de cachorros adestrados para serem guias de cegos.

De acordo com a denúncia de organismos dos Direitos Humanos, os fatores que fazem aumentar os lucros dos que investem no Complexo Industrial de Cárceres são os seguintes:

- Encarceramento de criminosos não violentos e longas penas de prisão por posse de pequenas quantidades de entorpecentes. A lei federal impõe cinco anos de prisão sem direito à liberdade condicional por posse de 5g de crack ou 3 onças e meia de heroína e 10 anos por posse de menos de duas onças de pedra-cocaína ou crack. Para impor uma pena de cinco anos, a pessoa deve ter 500 gramas de cocaína em pó, isto é, mais 100 vezes do que a quantidade de cocaína pela mesma sanção. A imensa maioria dos que usam cocaína é branca, da classe média ou alta. Os que mais usam crack são os negros e os latinos. No Texas, alguém pode ser condenado a dois anos de prisão por posse de quatro onças de maconha. Cá em Nova York, a lei antidroga, promulgada em 1973 por Nelson Rockefeller, estabelece de 15 anos à prisão perpétua por posse de quatro onças de qualquer entorpecente.

- A promulgação em 13 estados das “três strikes” (prisão perpétua, ao ser condenado por três crimes) levou a que se construíssem mais 20 penitenciárias. Um dos casos mais relevantes é um preso que, ao roubar um carro e duas bicicletas foi condenado a três penas de prisão de 25 anos.

- Alongamento das penas.

- Promulgação de leis que impõem penas mínimas, sem importarem as circunstâncias

- Grande extensão do trabalho dos réus, cujos lucros geram incentivos para encarcerar mais pessoas, por períodos longos.

- Alongamento das sanções aos presos.

A origem do trabalho dos presos está no fim da escravidão, depois da Guerra Civil de 1861, quando um sistema de “renda de presos” foi introduzido para manter a tradição da escravatura. Os escravos libertados foram culpados de descumprir suas obrigações como parceiros (produziam a terra do patrão e recebiam, em troca, uma parte da colheita) ou de pequenos roubos — que freqüentemente não eram provados — e então eram “alugados” para o trabalho no algodão, nas minas e construir ferrovias. Em Geórgia, desde 1870 até 1910, a força de trabalho contratada de 88% dos réus era negra. No Alabama, 93% dos mineiros “alugados” eram negros. No Mississipi, uma enorme quinta de prisioneiros, semelhante às antigas fazendas escravagistas, substituiu o padrão de alugar presos. A infame fazenda Parchman existiu até 1972. Depois da Guerra Civil, as leis de Jim Crow de segregação racial foram impostas em todos os estados, sendo decretada a segregação nas escolas, moradias, casamentos e em muitas outras esferas da vida. “Hoje, novas leis profundamente racistas impõem o trabalho escravo e oficinas onde predomina a fome, mediante o Complexo Industrial de Cárceres”, segundo analisou o Left Business Observer.

Quem investe? Pelo menos 37 estados já legalizaram o contrato de trabalho dos prisioneiros de corporações privadas que fazem suas operações dentro das penitenciárias estatais. Na relação de empresas-cientes aparecem as principais corporações dos EUA: IBM, Boeing, Motorola, Microsoft, AT&T, Wiewlwaa, Texas Instrument, Dell, Compaq, Honeywell, Hewlett-Packard, Nortel, Lucent Technologies, 3Com, Intel, Northem Telecom, TWA, Nordstrom, Revon, Macy’, Pierre Cardin, Target Stores e outras. Todas essas empresas andam entusiasmadas com o boom econômico derivado do trabalho dos prisioneiros. Entre 1980 e 1994, os lucros cresceram de US$ 392 milhões para US$ 1,31 bilhão. Os presos que trabalham no cárcere do estado recebem, em regra, o mínimo do pagamento, mas nalguns estados, como Colorado, os salários são de US$ 2.00 por hora. Contudo, nas penitenciárias privadas pagam 17 centavos por hora, de seis horas diárias de trabalho, sendo o salário de US$ 20 por mês. No cárcere CCA, em Tennessee, pagam salário máximo, isto é, 50 centavos por hora no trabalho classificado como “highly skilled positions” (posição altamente qualificada). Portanto, não espanta que os prisioneiros considerem uma generosidade os salários nos cárceres federais. “Ali, a gente pode receber US$ 1.2 por hora e trabalhar oito horas diárias e às vezes, mais horas. A gente pode mandar para casa até US$ 200 ou 300 cada mês”. Graças ao trabalho nos cárceres, os EUA são novamente uma atração para os investimentos em empregos que apenas eram concebidos para o Terceiro Mundo. Uma companhia que operava numa montadora do México, findou lá seus trabalhos e a transferiu para a penitenciária estatal de San Quenton, na Califórnia. No Texas, uma fábrica demitiu seus 150 empregados e contratou os serviços dos operários-réus do cárcere privado em Lockhart, Texas, lugar onde se montam também circuitos de teclados para companhias como a IBM e a Compaq. O representante do estado de Oregon, Kevin Mannix, há pouco, instou a Nike a levar sua produção na Indonésia para seu estado natal, indicando aos sapateiros que “não haverá custos de transporte. Oferecemos-lhes um emprego competitivo do cárcere (aqui)”.

A privatização dos cárceres chegou ao apogeu em 1980, durante os governos de Ronald Reagan e Bush pai, mas alcançou o máximo crescimento em 1990, durante a administração de Bill Clinton, quando as ações em Wall Street se vendiam a toda hora. O programa de Clinton para reduzir a força de trabalho federal provocou que o Departamento de Justiça aceitasse como contrato corporações de cárceres privados, o encarceramento de trabalhadores indocumentados e prisioneiros considerados muito perigosos. Os cárceres privados representam o setor mais pujante do complexo industrial de cárceres. Por volta de 18 corporações custodiam 10 mil presos em 27 estados. As duas maiores são a Corporação Correcional da América (CCA) e a Wackenhunt, que controlam 75%. Um cárcere privado recebe uma quantidade de dinheiro de cada prisioneiro, independentemente de quanto custa manter o preso.

De acordo com o administrador de cárceres privados da Virgínia, Rusell Boraas, o “segredo de operar a baixo custo é dispor de um número mínimo de guardas vigiando o maior número de presos”. A CCA tem um cárcere supermoderno em Lawrenceville, Virgínia, onde cinco guardas de dia e dois à noite vigiam 750 réus. Nos cárceres privados, podem-se reduzir as penas por “bom comportamento”, mas se alguém transgride as normas, acrescentam-se 30 dias à sentença, isto é, mais lucros para a CCA. Conforme uma pesquisa sobre os cárceres em Novo México, se revelou que as mulheres presas da CCA perderam “o bom comportamento” em média mais oito vezes do que nos cárceres estatais.

Há tantos lucros que agora surgiu um novo negócio: importação de presos com longas penas, isto é, os criminosos piores. Quando o juiz federal determinou que era uma punição cruel e incomum que estivessem superlotados os cárceres, a CCA assinou acordos com os vereadores de condados pobres para construir novos cárceres e partilhar os ganhos. Segundo o Atlantic Monthly (dezembro de 1998), este programa foi apoiado por investidores de Merrill-Lynch, Shearson-Lehman, American Express e Allstate e a operação se espalhou pela área rural do Texas. A governadora Ann Richards imitou o exemplo de Mario Cuomo em Nova York e construiu tantas penitenciárias estatais que invadiu o mercado, diminuindo os lucros das privadas.

Em face de que uma lei assinada por Clinton, em 1996 — que pôs fim às supervisões e decisões da corte — ocasionou amontoamento e violência e incerteza dentro dos cárceres, as corporações dos cárceres privados no Texas contataram outros estados cujas penitenciárias estavam superlotadas, oferecendo-lhes o serviço de “renda de cela” nos cárceres da CCA nos pequenos povoados do Texas. A comissão do comprador de camas é de US$ 2.50 a 5.50 em cada dia. O condado recebe US$ 1.50 de cada réu.

Os 87% dos 125 mil presos federais são criminosos não violentos. Considera-se que mais de metade dos 623 mil réus de cárceres municipais ou dos condados são inocentes dos crimes que lhe imputam. Deles, a maioria está à espera de julgamento. Dois terços partes de um milhão de reclusos estatais cometeram delitos não violentos. Os 16% dos dois milhões de presos padecem alguma doença mental.

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