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Subject: A crise da Europa | |
Author: Sami Naïr |
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Date Posted: 27/01/07 12:08:41 A crise da Europa Sami Naïr * A tomada de posição de Laurent Fabius, ex‑primeiro‑ministro francês, a favor de um não condicional à Constituição europeia, que de facto é um não seguro; a actual composição da Comissão Europeia, resultado da massiva vitória das forças liberais na Europa; o estado de ânimo de uma parte importante da esquerda, claramente orientada para o não; a estagnação da economia europeia; o retorno aos velhos complexos nacionalistas entre as camadas socialmente excluídas do bem‑estar na própria Europa; todos estes factos, somados a dezenas de outros, indicam que a Europa está em crise. Negá-lo não serve de nada: a época lírica europeia chegou ao seu fim. Tudo faz pensar que dos 25 países da União, haverá pelo menos um que rejeitará esta Constituição. Isto é, que não será aprovada. Por quê? Porque a Europa, em parte, defraudou. Actualmente, os países ricos perdem socialmente mais do que ganharam economicamente no concerto europeu; além disso, as suas posições vêem‑se socavadas pela coligação dos países pequenos e médios. Estes beneficiam da União, mas estão, por sua vez, dominados economicamente e não podem, apesar dos enormes fundos estruturais que lhes concede a União, escapar à especialização que lhes impõe a Comissão a partir de Bruxelas. Daí a sua vontade de defender raivosamente os seus interesses. Quanto aos novos membros procedentes dos países do Leste, a sua entrada está condicionada por restrições humilhantes tanto para a obtenção dos fundos de ajuda como para a livre circulação dos seus cidadãos. Sem contar, por fim, com a política externa que divide mais do que nunca os europeus, apesar do talento diplomático de Javier Solana. De facto, o europeísmo, que na prática reduziu, ao longo destes últimos 20 anos, a tradicional oposição entre a cultura política de direita e de esquerda, está a agonizar. Este europeísmo tinha historicamente um fim positivo: tirar a Europa do atoleiro do nacionalismo pusilânime e convertê-la numa autêntica potência mundial. Actualmente, os cidadãos europeus têm a impressão de que a Europa é uma conjunção desgarrada de interesses contraditórios e um anão político. De facto, as opiniões públicas não perdoam às suas elites que não tenham construído uma Europa unida, mas um complicado patchwork institucional, afastado da sua vida quotidiana. Não se identificam com uma Constituição abstracta, formada por hábeis equilíbrios institucionais potencialmente explosivos. E, sobretudo, não percebem que este texto represente uma garantia para a melhoria da sua vida presente e futura. Este é o verdadeiro problema. Por mais que os partidários da Constituição expliquem que com a sua aprovação as coisas irão melhor, os cidadãos cépticos mostram‑se frios como o mármore. Esta crise de confiança é o que captou Laurent Fabius, que apesar de tudo é um declarado partidário do social-liberalismo, ou em qualquer caso não é suspeito de manter uma postura hostil para com a Europa. E em consequência, propõe as suas condições, aliás todas elas centradas na questão do emprego e da manutenção de um alto nível de prestações sociais. A verdade é que aí reside a grande debilidade da Europa liberal. É extremamente difícil que um assalariado francês admita que deve renunciar à excepcional qualidade dos seus serviços públicos em benefício dos serviços de interesse geral à americana que a Europa está a instaurar; é inconcebível que um cidadão alemão compreenda que a reforma por baixo do modelo social alemão é inelutável para modernizar a economia do país, etc., etc. A Europa, é necessário repeti-lo a todo o momento, não é um assunto do coração, mas de interesses compartilhados. Deve representar uma melhoria e não uma regressão social para os cidadãos. Ora bem, as últimas eleições europeias demonstram a gravidade da situação: mais de 60% do eleitorado europeu absteve‑se. A subida dos partidos ultranacionalistas é hoje em dia geral em toda a Europa. Isso sim é uma reacção nacionalista provocada pelo temor gerado pelas políticas económicas de Bruxelas. O pacto de estabilidade, cujo preço foi pago com milhões de desempregados nestes últimos anos, aparece hoje como uma arma destruidora entre as mãos das elites financeiras europeias. Nem a França nem a Alemanha podem adaptar as suas normas sem destruir sectores inteiros das suas políticas públicas. Isto ocorre num contexto em que a Europa não faz nada para assegurar o futuro: não há investimento numa política industrial comum, não há verdadeira estratégia a longo prazo nos sectores da investigação e desenvolvimento, inclusive não há nada para assegurar a identidade militar da União Europeia (entregada à NATO). A política do Banco Central Europeu está estritamente baseada na defesa do euro forte, o que impede competir com o dólar e, sobretudo, cria obstáculos a uma verdadeira política de criação de emprego. O que é grave é que o projecto de Constituição constitucionaliza esta situação. Por isso é que há crise e rejeição. Seria um terrível erro perceber esta crise de confiança como um retorno ao nacionalismo, uma oposição a outros povos. Trata‑se de outra coisa: uma parte cada vez mais importante dos cidadãos europeus tem simplesmente a impressão de que nesta empresa perde mais do que ganha. Pois a governabilidade, a adesão política e o consenso democrático não estão, nas grandes democracias modernas, vinculados a um idealismo do sacrifício, mas à manutenção do nível de vida e das conquistas sociais. Nada, e sobretudo não o belo ideal europeu, deve justificar o aumento da precariedade, o desemprego estrutural, a privatização dos serviços públicos (educação, previdência, investigação) e a impotência política. A Europa precisa de defensores lúcidos, que compreendam que também deve servir os interesses dos mais débeis, dos mais pobres, e não só apostar pelas finanças. Não integrar a dimensão social na construção europeia, fazer do liberalismo integral o único ideal possível do futuro de Europa, é eleger o possível fracasso da União Europeia. A Constituição europeia corre o risco de ser a sua primeira manifestação. ____________ * Sami Naïr é professor de Ciências Políticas da Universidade de Paris-VII [ Next Thread | Previous Thread | Next Message | Previous Message ] |
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Re: A crise da Europa | Beneditos | 27/01/07 12:12:51 |