Subject: Governo Santana/Sampaio |
Author:
EDgar Correia
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Date Posted: 22:21:18 07/12/04 Mon
Governo Santana/Sampaio
por Edgar Correia (Jornal de Notícias 12/07/2004)
O presidente da República tomou a decisão de nomear para primeiro-ministro a escolha do Conselho Nacional do PSD/PPD para o desempenho desse cargo.
Como o presidente salientou no seu discurso, colocavam-se perante ele duas decisões possíveis: ou o caminho que veio a seguir, ou a convocação de eleições legislativas antecipadas. A bóia de salvação que decidiu lançar à coligação dos partidos da Direita, protegendo-os do veredicto democrático do eleitorado, situa-se, pois, no terreno das suas opções exclusivamente políticas.
Como políticas são as razões que levam o cidadão que subscreve estas palavras a discordar da nomeação de um primeiro-ministro de "aviário" e da formação de um novo governo sob o signo do medo da realização de eleições, bem como a considerar incompreensível o comprometimento do presidente com "a continuidade das políticas essenciais" do Governo cessante. E a ajuizar que uma tal solução não só não dispõe do mínimo de condições e de legitimidade políticas para mobilizar a sociedade portuguesa para enfrentar as suas actuais dificuldades, como comporta riscos de uma deriva populista que o presidente, para mais em final de mandato, ficou com poucas condições para esconjurar.
O facto do presidente ter decidido ignorar o agravamento objectivo dos problemas do país e dos portugueses e os inequívocos sinais de descontentamento manifestados com a política que vinha a ser seguida é muito negativo.
Como igualmente negativo é o facto do presidente não ter devolvido a palavra aos portugueses para que estes ajuizassem a acção do Governo que está de saída, em consequência da "opção pessoal" do primeiro-ministro (Jorge Sampaio dixit), e para que pudessem decidir sobre a nova solução governativa e quem a deveria protagonizar. Consulta tanto mais imperativa quanto as recentes eleições europeias, cuja interpretação política foi inequívoca, permitem fundar a dúvida sobre a falta de correspondência entre a composição do Parlamento e a vontade actual do eleitorado.
Chega a ser incompreensível que o presidente - num zelo destituído de cobertura constitucional - tenha entendido impor ao futuro governo a "continuidade das políticas essenciais" do governo anterior. Postura que além de merecer o agradecimento dos partidos da Direita, verdadeiramente encantados com a exigência, comporta o risco de co-responsabilização da Presidência pelas opções governativas mais controversas.
Mas a surpreendente formação deste verdadeiro Governo Santana-Sampaio, para além dos seus efeitos na esfera governativa, tem consequências que não são menos graves em relação às instituições democráticas, com a aproximação do semi-presidencialismo consagrado na Constituição da República a um regime de parlamentarismo puro. O que num quadro em que a actividade da Assembleia da República está longe de beneficiar da imagem e do prestígio público desejáveis, enfraquece objectivamente a capacidade adaptativa que o sistema democrático tem conservado até agora.
Acresce a tudo isto as condições em que o presidente da República tomou a sua decisão, com quase um mês decorrido desde o momento que Durão Barroso o informou da possibilidade da sua demissão. O fundamental não parece ser determinar se o presidente viveu, ou não, durante estas semanas, um verdadeiro processo de indecisão política. A questão é se não teria sido seu absoluto dever, fosse qual fosse a sua decisão, mas sendo sobretudo a que tomou, ter poupado o país ao processo de acentuada divisão política que se verifica.
O presidente não prestou desta vez um bom serviço a Portugal e à democracia.
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