Subject: O NOVO CICLO POLÍTICO |
Author:
Paulo Fidalgo
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Date Posted: 26/02/05 19:23:01
O NOVO CICLO POLÍTICO
por Paulo Fidalgo
(IN WWW.COMUNISTAS.INFO)
Em Fevereiro, um novo ciclo político se abriu. Os portugueses compareceram em massa para quebrar tempos de abstenção e hesitação de actos eleitorais anteriores, e afirmar agora uma lição democrática clara.
As direitas recuaram para um nível recorde de baixa votação, e a esquerda atingiu praticamente os 60% de representação parlamentar: PS 120 eleitos + CDU 12 eleitos + BE 8 eleitos.
A distribuição dos ganhos à esquerda merece contudo uma análise mais aprofundada.
O PS ganha cerca de 500000 votos (mais 7 pontos percentuais) mas, ao nível da percentagem e fruto da maior afluência, conquista apenas 1% a mais do que o limiar da maioria absoluta, habitualmente localizado nos 44%. É uma grande vitória sem dúvida, mas que não permite qualquer triunfalismo.
E sobretudo motiva reflexão a extraordinária afirmação eleitoral à sua esquerda que alcança cerca de 14%. Se compararmos com 2002, onde obteve 9,7 %, num ambiente considerado favorável da crítica à governação de António Guterres, verificamos que a progressão agora da esquerda é muito mais expressiva, com mais 43% (+ 4,2 pontos percentuais). O PS assegura o centro mas falha em conquistar representação à sua esquerda!
O crescimento significativo da esquerda à esquerda do PS não é, contudo, igual entre as várias formações.
A CDU interrompe a queda de representação das eleições passadas e conquista mesmo 3 novos mandatos. Onde se inclui a simbólica recuperação do deputado por Braga, mais um no Porto e mais um em Lisboa, com mais 55 centésimas de ponto percentual na votação global e mais 54000 votos. Conquista a posição de terceira força parlamentar.
Contudo, há contraditoriamente fenómenos preocupantes na votação nacional na CDU que deveriam obrigar a uma reflexão política, tanto mais que este crescimento, a todos os títulos modesto, acontece numa conjuntura onde toda a esquerda ganha. Perde um mandato no mais emblemático distrito operário do país, Setúbal, onde tem o seu mais grave insucesso, e recua na percentagem de representação no Alentejo. Os sinais de que a sua força eleitoral está sob ameaça, exprimem-se no facto de se ter quedado como quinta força, atrás do BE, em muitos distritos do país.
O BE é um dos grandes vencedores da contenda conseguindo polarizar parte significativa da esperança de mudança do eleitorado, a par do PS.
O BE tem uma inédita subida, de 149000 votos em 2002, para 364000 votos em 2005. A sua representação alcança os oito mandatos com mais um no Porto, dois em Lisboa, e dois em Setúbal, distrito onde não tinha antes qualquer representação. Na maioria dos distritos regista grandes avanços e fica “à pele” de eleger mandatos em Braga, em Aveiro e no Porto, e ultrapassa com clareza a CDU no distrito do Porto e na cidade de Lisboa.
A esquerda à esquerda do PS não conseguiu contudo evitar a maioria absoluta do PS.
Parte das razões resultam da natural tendência do eleitorado do PSD deslizar para a formação politicamente mais próxima à sua esquerda.
Porém, naquilo que é sua responsabilidade, sublinha-se sem prejuízo de mais discussão, que a esquerda não contrariou o discurso do PS de suposto detentor único de uma saída de governo e mostrou relutância em ser parte numa solução. Limitou-se a esgrimir a ideia de viabilizar apenas acordos pontuais no parlamento, um instrumento certamente válido, mas encarado justamente por muitos eleitores como insuficiente, para gerar um governo com sustentação.
O crescimento da esquerda que quer transformar Portugal, depende naturalmente, da sua força de dinamização social e popular. Depende igualmente da sua capacidade ganhar experiência de administração e direcção nos múltiplos organismos do Estado e da economia. Mas dependerá seguramente, também, da sua capacidade em tornar-se no futuro força de governo. Com políticas transformadoras, credíveis, com um rigoroso equacionamento dos problemas, e com a arma única que lhe é própria: o sentido progressista e emancipador dos seus ideais.
O PS alcança a maioria absoluta num ameaçador momento de crise económica e social. Para a esquerda à esquerda do PS, o objectivo nesta fase é o de abrir caminho para que as actuais dificuldades sejam superadas.
Importa agora agregar energias transformadoras para que se consolide e afirme um verdadeiro programa para a transição e a alternativa que articule a intervenção institucional e popular da esquerda e para que se consiga vencer o status quo responsável em última análise pelo retrocesso dos últimos anos.
A esquerda deve colocar com clareza ao PS que os sacrifícios para superar a crise têm de valer a pena para que o povo neles se empenhe. Têm de conduzir a uma nova política de emprego, reforçar a segurança social pública, reformar o SNS, concretizar a reforma fiscal e iniciar um ambicioso projecto educativo e de requalificação profissional. Um sinal imediato por parte do novo governo do PS seria agendar quanto antes a despenalização do aborto e dar mostras de autoridade na inspecção fiscal ao desaparecimento das mais de 20000 declarações de altos rendimentos relativas a 2003.
Um PS, mesmo com maioria absoluta, não será certamente suficiente para enfrentar os duros desafios que se colocam ao país sem que as forças sociais e populares se empenhem igualmente num projecto modernizador. Será por isso urgente batalhar pela montagem de um contrato democrático para a modernização de Portugal que dê substância e viabilidade ao novo ciclo político iniciado em Fevereiro de 2005. A esperança gerada pela vitória de Fevereiro não pode ser frustrada.
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