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Vasco Pulido Valente, Público, 25/02/05
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Date Posted: 25/02/05 11:39:17
Um novo "ciclo"?
Por Vasco Pulido Valente, Público, 25/02/05
Na noite de 20 de Fevereiro, Paulo Portas resolveu dizer que tinha chegado o fim de um "ciclo" e toda a gente começou logo a falar do "ciclo" e do seu fim, como se fosse óbvio que política portuguesa se dividia por "ciclos" e que de repente começava um novo. Mas, tirando a infantilidade clássica ("até aqui não valeu, agora é que é a sério"), não se vê muito bem que mudança nos separa tão nitidamente do passado.
A derrota de Santana e Paulo Portas não acaba por si só com o populismo. Nem um, nem outro o inventaram e a sociedade que o permitiu e lhe deu força continua na mesma.
Pior: se alguma coisa, em 20 de Fevereiro, o populismo, como está na sua natureza, passou em parte, da extrema-direita para a extrema-esquerda, do PP e Santana para o "Bloco" de Louçã.
Além disso, os dois "partidos do regime", o PS e o PSD não parecem perto da reforma. Para começar, encheram a Assembleia da República com a tropa fandanga que precisamente se trata de remover. E, depois, nunca um "aparelho" se limpou de "interesses", de "caciques", de "facções" com a eleição directa do "chefe", que hoje (e apesar do exemplo inquietante Sócrates) se tornou uma espécie de panaceia. O PS no governo e o PSD na oposição não podem deixar de ser o PS e o PSD que nós conhecemos, quando o PSD era o governo e o PS a oposição. A reforma dos "partidos do regime" depende evidentemente da reforma do regime.
Mas não chega a enorme maioria do PS para inaugurar um ciclo "socrático", como as maiorias de Cavaco acabaram por fazer o "cavaquismo"? Não chega. Até admitindo a equivalência de Cavaco e Sócrates, que, pelo menos por enquanto, implica uma certa imaginação, o país de 1985 nem de longe se compara ao país de 2005. Falido, estagnado e arcaico, Portugal precisa que o levem à força e à má cara para o mundo real, que os portugueses detestam. Os valores de uma cultura camponesa pobre, como a nossa, são a segurança e a rotina. Nada mais contrário ao que nos propõem: a iniciativa, a competição, o risco. A ideia de que algumas "políticas", sempre copiadas daqui ou dali, nos conseguem converter à "modernidade" é uma ilusão muito velha e pouco original. Sócrates vai bater com a cabeça no défice, na economia, no Estado, nas corporações, nos mil e um direitos que se acham eterna e justamente "adquiridos". A saída de Santana e Portas vale o que vale: um alívio. Não vale um novo "ciclo".
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