Subject: Re: A vergonha e a falta dela |
Author:
João Luís
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Date Posted: 25/02/05 10:58:37
In reply to:
José Vítor Malheiros, Público, 22/02/05
's message, "Re: A vergonha e a falta dela" on 25/02/05 10:11:49
Já agora não sofre do mesmo mal quem só pôs aqui esta parte do texto? Porque é que não pôs o texto completo?
Já que não teve essa coragem, faço-o eu:
A vergonha e a falta dela
Por José Vítor Malheiros
PS - É surpreendente que o melhor resultado de sempre do PS ocorra com um líder sem rasgo particular, depois de uma campanha defensiva, com um programa tímido e sem caras fortes a acompanhá-lo. É revelador da falta de credibilidade de Santana Lopes, mas também do esgotamento do PPD/PSD. A vantagem do resultado é que os portugueses vão pela primeira vez provar um governo PS com apoio parlamentar, o que não admite quaisquer desculpas e será clarificador da cena política.
PSD - Teve uma enorme derrota, mas não a maior de sempre, nem sequer um resultado vergonhoso. Como Santana Lopes disse, o PSD já ganhou eleições com resultados semelhantes. Por outras palavras: os portugueses correram com o homem do governo, mas não o correram do PSD nem da política. Se alguém como Santana Lopes tem a votação que tem depois de ter feito o que fez, o que será preciso para que o povo obrigue um líder político a fugir de vergonha? O resultado prova que o populismo de Pedro Santana Lopes tem a sua eficácia, que há quem confunda descaramento com coragem e leviandade com decisão. O homem não tem vergonha e o povo não teve suficiente vergonha dele. A reacção de Santana Lopes mostra que a sua ambição pessoal e desplante não têm limites, que só sairá pela força. Para já, foi contar as espingardas e avisou os timoratos que não vai hesitar em disparar. Agora é o momento de verdade do PSD, que vai ter oportunidade de nos mostrar quem é.
CDU - A coligação beneficiou de uma conjuntura favorável, com o país cansado da direita, com a direita concentrando ataques no BE, com um novo líder, mais expressivo e dinâmico. A votação na CDU mostra que a hemorragia pôde ser estancada, mas isso não significa que o paciente vá recuperar a saúde de outros tempos. O organismo está envelhecido e é provável que isto seja o melhor que é possível. O crescimento do BE não augura nada de bom à CDU e ao PCP. O resultado da CDU parece fruto não da conquista de novos votantes, mas de uma maior mobilização momentânea dos votantes clássicos.
PP - Perante um resultado que é uma derrota, mas está longe de ser vergonhoso, Paulo Portas encontrou o tom certo para assumir responsabilidades. Mas é significativo que se mantenha à disposição da futura direcção para aquilo que ela entender pedir-lhe. Mesmo que não lhe apeteça dirigir o partido durante a próxima travessia do deserto, o líder não abdica da sua posição de figura tutelar, ainda que na sombra (como já fez no passado) e alinha-se para momentos mais propícios.
BE - A vitória do BE, com o maior crescimento de todos os partidos, muito mais votos, muito mais deputados, foi ensombrada pela falha em alcançar dois objectivos (irreflectidamente) anunciados: ser a terceira força política e evitar a maioria absoluta política do PS. Um partido que se pretende responsável e inovador não pode apresentar o objectivo formal de "ser o terceiro"; por outro lado, na conjuntura particular das eleições, apresentar o PS como inimigo principal deixa ver um sectarismo que não permite esperar o melhor. Que o BE ainda não digeriu o novo xadrez político revela-se, por outro lado, pelo anúncio da proposta de referendo sobre o aborto, em vez de propor a alteração da lei no quadro da nova Assembleia da República, como parece mais eficaz.
Abstenção - A descida da abstenção para 35 por cento é uma boa notícia, mas não se pode considerar positivo que um em cada três eleitores prefira não votar. Nem pode servir de consolação que a abstenção seja igual ou superior noutros países. Uma democracia não se pode contentar com um nível de abstenção desta ordem (51,8 por cento nos Açores!) e deve eleger o combate contra o abstencionismo como uma batalha permanente, com acções concretas de mobilização e de educação cívica junto da juventude.
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