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Subject: O Livre Comércio é a expressão da moda


Author:
Osvaldo Martínez
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Date Posted: 7/07/05 11:14:03

Osvaldo Martínez
por Osvaldo Martínez [*]
O Livre Comércio é a expressão da moda, talvez a mais manipulada no mundo de hoje.

Nos anos 90 a resistência dos movimentos sociais foi contra o modelo neoliberal, que então se associava aos planos de "ajustamento estrutural" emanados do Fundo Monetário Internacional e calorosamente apoiados pelo Banco Mundial.

Actualmente vivemos a "onda do livre comércio", que ultrapassou muito o significado tradicional da expressão livre comércio e hoje significa não só e não tanto comércio como a projecção global de uma estratégia de dominação imperialista que utiliza o neoliberalismo como seu modo de ser, mas que se ramifica e estende, constituindo um verdadeiro pacote integrado.

Hoje, quando ouvimos a expressão livre comércio nos lábios do governo do Estados Unidos, do G-7, do FMI, do BM, isto significa muito mais que comércio e inclui a ALCA e as negociações da OMC, os Tratados Bilaterais e Plurilaterais de Livre Comércio e de Investimentos, os Acordos Regionais como o Plano Puebla Panamá, o Acordo Andino sobre Comércio e erradicação de drogas, os planos de militarização e repressão como o Plano Colômbia, a instalação de bases militares e a dívida externa.

Para o paradigma neoliberal que o FMI, o Banco Mundial e os governos do G-7 defendem calorosamente, o problema é bem claro e simples: com maior liberalização comercial, maior crescimento económico, redução da pobreza e progresso geral. Segundo eles, só com um comércio genuinamente livre o mercado funcionará de modo perfeito, fará as melhores distribuições de recursos e estabelecerá a especialização óptima para cada país. Para que o mercado funcione de modo perfeito, nada deve perturbar a sua livre actuação. O Estado deve tirar as suas mãos do comércio e da economia em geral para deixar que o mercado e as vantagens comparativas por ele decididas resolvam tudo da melhor maneira possível.

Não é mais do que a velha teoria liberal que se remete a Adam Smith e A riqueza das nações, de 1776, agora maquilhada com modelos econométricos, e retórica refinada, mas com as carências que sempre teve desde a sua origem e não pôde apagar, isto é, vantagens comparativas estáticas concebidas para que o livre mercado as aprofunde e as torne eternas, combinação de recursos e factores também estáticos num mundo de pequenas empresas de dimensões relativamente semelhantes no qual nenhuma empresa poderia ter vantagens decisivas sobre outras quanto a informação, financiamento ou tecnologia. Um mundo sem empresas transnacionais, com um comércio internacional quase exclusivamente de bens, sem monopólios de propriedade intelectual, sem comércio intra-firma nem cadeias corporativas gigantescas que controlam dentro do seu circuito desde a plantação de café até a sua comercialização final. Um mundo sem as realidades determinantes do capitalismo contemporâneo e portanto incapaz de explicar o que ocorre, mas que os neoliberais invocam sempre como a raiz suprema da ciência económica.

Não é possível esquecer que o livre comércio, ao nascer como teoria com Smith, concedeu aos Estados Unidos uma crescente prosperidade com base na sua agricultura. Deviam ignorar as manufacturas industriais e aproveitar a sua vantagem agrícola enquanto importavam manufacturas britânicas. Mas, personagens governamentais dos Estados Unidos, como Abraham Lincoln, fizeram tudo ao contrário e poderiam ser hoje qualificados pela retórica liberalizadora do governo de Bush como horríveis proteccionistas porque puseram o governo a desempenhar um papel activo para modificar a vantagem comparativa estática e criar outras vantagens que fizeram com que os Estados Unidos abandonassem o seu papel de país agrícola.

A história real não se compadeceu com a teoria liberal do comércio exterior, mas curiosamente o economista que é apresentado como o intelectual máximo que sustenta a perfeição do livre comércio era menos radical na sua fé livre-cambista do que os discursos de Bush sobre as bondades da ALCA ou os Tratados de Livre Comércio.

As seguintes palavras de Adam Smith deixariam muito insatisfeitos o Departamento de Comércio dos EUA, o FMI, o BM e os interesses dominantes na OMC que exigem uma liberalização imediata e total: "A humanidade pode necessitar que a liberdade de comércio seja estabelecida através de uma lenta graduação e com uma boa dose de reserva e circunspecção". (Oxfam, 2002)

Para os países subdesenvolvidos o livre comércio é outra coisa, bem diferente.

Para Eduardo Galeano, "a divisão do trabalho entre as nações consiste em que umas se especializem em ganhar e outras em perder" (Galeano, 1989). Examinado com objectividade, o comércio internacional cumpre hoje várias funções no sistema imperialista de dominação caracterizado pela globalização de signo neoliberal.

Essas funções são instrumento de domínio em favor dos países ricos, factor de acentuação e perpetuação de desigualdades e iniquidades e cenário de uma guerra virtual pelo controle dos mercados actuais e os do futuro.

Inclusive mais: o livre comércio não é livre agora nem nunca o foi, nem é já sequer comércio de acordo com o conceito clássico deste, nem sua prática gera crescimento económico per se, nem reduz a pobreza, nem reparte "benefícios mútuos" entre as partes que comerciam.

Em 1963 Che Guevara dizia: "Como pode significar benefício mútuo vender a preços de mercado mundial as matérias-primas que custam suor e sofrimento sem limites aos países atrasado e comprar a preço de mercado mundial as máquinas produzidas nas grandes fábricas automatizadas do presente?" Pertence também a Che Guevara esta definição exacta do livre comércio: "livre competição para os monopólios; raposa livre entre galinhas livres".

O livre comércio é hoje, antes de tudo, a frase retórica com que se apresenta um pacote neoliberal bem orgânico e coerente no que diz respeito aos interesses das transnacionais e dos governos que os representam, e que não se reduzem aos temas clássicos que sempre apareceram nos livros de economia no capítulo do comércio internacional.

De facto, quando aos países do Terceiro Mundo se lhes recomenda o livre comércio, seja como política adequada para aplicar, seja como proposta para estabelecer um Tratado de Livre Comércio, o comércio não é a única peça e nem sequer a mais importante.

Nesta peculiar retórica neoliberal o livre comércio interessa, mas interessa tanto ou mais a livre mobilidade do capital, a liberalização da conta de capital da balança de pagamentos que equivale à taxa de câmbio de mercado e a liberdade para fugir com o capital, liberdade para o que capital transnacional invista à sua escolha e liberdade para que contrate em condições de "flexibilidade laboral" uma força de trabalho indefesa.

Uma novidade do livre comércio é a capacidade de vincular novas e avançadas tecnologias com baixíssimos salários da força de trabalho.

O livre comércio tornou-se o irmão menor de uma financeirização da economia mundial na qual o montante das exportações mundiais num ano (uns 9 milhões de milhões de dólares) é apenas aquilo que em três dias move em transações o mercado financeiro globalizado com sua especulação desenfreada em bolsas de valores, acções, bónus, derivados, especulação com taxas de câmbio de moedas.

Portanto, a primeira conclusão é que o livre comércio de hoje não é só e nem tanto uma abertura comercial em bens e serviços mensurável na balança comercial e sim uma estratégia de política dos países desenvolvidos para impor o modelo neoliberal por ser o que melhor serve os interesses dos consórcios transnacionais que são, por sua vez, os conceptualizadores da economia mundial.

Existe um abismo entre a retórica do livre comércio e a sua prática real. Aquilo que o poder mediático difunde a mensagem linear, simplista, que reduz a racionalidade económica a um irracional e primário esquema no qual a "boa economia" é sempre e para sempre o livre comércio em luta cerrada contra o proteccionismo estreito e absurdo que pretende desviar o ditame supremo do mercado com intervenções governamentais ou tentando substituir importações ou integrar mercados de países subdesenvolvidos com critérios de preferência regional ou subregional.

Esse poder mediático não difunde realidades como a seguinte:

O livre comércio promete uma vantajosa "inserção no comércio mundial" para os países pobres que cumpram as suas regras.

Mas entre 1953 e 2002 a participação dos países subdesenvolvidos nas exportações mundiais de bens diminuiu de 35,6% para 26,1% (Oxfam, 2002).

Os partidários do livre comércio dizem-nos que esta diminuição está compensada pela maior participação do Terceiro Mundo nas exportações de alta tecnologia, as quais passaram a ser de 10% em 1985 para 25% cerca do ano 2000.

Isto não mais do que uma miragem estatística e está muito longe de significar um aumento da investigação científica, da educação e do conhecimento que estariam por trás dessas supostas exportações de alta tecnologia.

Não se trata mais do que comércio "intra-firma e intra-produto", ou seja, intercâmbios no interior das cadeias de empresas transnacionais que dentro delas e aproveitando a mobilidade planetária do capital, "compram" e "vendem" para si mesmas numa caricatura de comércio internacional que contudo aparece nas estatísticas como exportações de países em desenvolvimento.

Este comércio dentro das transnacionais estima-se actualmente nuns 2/3 do comércio mundial.

Este comércio "intra-firma" e "intra-produto", no qual uma transnacional compõe um produto final como resultado da montagem de partes produzidas nos países que menores custos ofereçam, especialmente custo laboral, modificou o significado da chamada "inserção no comércio mundial".

Essa inserção não é a expressão do esforços nacional para abrir caminho na suposta "livre competição" e sim que a inserção é o acesso aos mercados corporativos internos, nos quais os países pobres nada decidem e em que só recebem passivamente as decisões tomadas pelas corporações.

Quase toda a retórica que despeja a OMC, o FMI, o Banco Mundial, louvando o avanço de alguns países do Sul no comércio de bens de alta tecnologia, não significa em termos reais senão processos corporativos nos quais a Wal-Mart, Toyota, Nestlé ou outras corporações decidiram dispersar partes de produções nos países que melhores concessões lhe dêem. Esse processo não é outra coisa senão o domínio corporativo numa nova escala na qual a submissão é mais refinada mas não deixa de ser submissão. Houve, sim, "uma inserção no comércio", mas não foi além de uma inserção subordinada dentro de uma cadeia corporativa.

Se o suposto avanço no comércio de bens de alta tecnologia é só uma miragem baseada num novo padrão estratégico das corporações, é também assustador comprovar que o Sul retrocede inclusive no seu triste e tradicional reduto onde as vantagens comparativas o recluíram: o comércio de produtos básicos.

Com os produtos básicos está a verificar-se que os seus preços e a relação de intercâmbio resultante continua a sua tendência secular para o descenso, que o seu comércio cresce mais lentamente que o de qualquer outro tipo de produto, que estão cativos em cadeias de comercialização controladas por consórcios transnacionais e que os países são induzidos a exportar cada vez mais produtos cujo preço é menor quanto mais exportam.

Com efeito, a relação de intercâmbio dos países do Sul — excluído o petróleo e as manufacturas — caiu mais de 20% desde 1980. Para a África a queda foi superior a 25%.

A África teve de aumentar as suas exportações em mais de um terço para manter o mesmo nível das importações que fazia em 1980.

Estes países são induzidos a exportar o máximo pelo FMI, Banco Mundial e OMC, mas o resultado é fatídico. Enquanto as exportações de café aumentaram de 3,7 milhões de toneladas em 1980 para 5,9 milhões no ano 2000, a receita recebida pelas mesmas caiu de US$12,5 milhões para US$10,3 milhões em 2000.

Mas ainda há mais: no começo dos anos 90 as receitas dos países produtores de café eram de uns 10-12 mil milhões de dólares e o valor das vendas de café em países desenvolvidos era de uns 30 mil milhões. Agora os produtores recebem só 5,5 mil milhões, enquanto as vendas nos países desenvolvidos ultrapassam os 70 mil milhões de dólares.

Isto se explica pelo excelente "equilíbrio no poder de mercado" criado pela onda de fusões e aquisições que levaram à estruturação de umas quatro ou cinco "trading companies" gigantescas que compram uns 15 milhões de sacos de café de 60 kg a cada ano. Frente a elas apresentam-se para receber o infalível ditame do mercado um produtor camponês que vende em média menos de 5 sacos (Oxfam, 2002).

Outro exemplo entre muitos desta excelente actuação do livre comércio é do abastecimento de bananas ao mercado do Reino Unido. Na produção participam uns 400 mil trabalhadores, mas na comercialização apenas cinco empresas têm mais de 80% do mercado.

Os porta-vozes do livre comércio dizem que este é um instrumento para reduzir a pobreza. Mas o aumento do comércio mundial desde os anos 80 contradiz isso. Ao principiar o século XXI as pessoas que lutam por sobreviver com menos de um dólar por dia não são menos que então e o mesmo ocorre com os que recebem menos de dois dólares por dia. Não existe correlação entre o crescimento do comércio e a redução da pobreza. O México multiplicou as suas exportações e no mesmo período viu multiplicar-se a quantidade de pobres.

Os porta-vozes do livre comércio dizem que as exportações industriais dos países subdesenvolvidos cresceram com muita força.

É uma verdade estatística que é, ao mesmo tempo, uma mentira no que significa de desenvolvimento verdadeiro. Explica-se no essencial pelo comércio intra-firma. Mas, além disso, sua distribuição geográfica deixa de fora vastas áreas do mundo subdesenvolvido.

O leste da Ásia representa mais de 2/3 das exportações indutriais do Sul e mais de 3/4 nos sectores tecnológicos de alto rendimento como a electrónica. Mas em troca o sul da Ásia, África subsahariana e América Latina (se excluirmos o crescimento maquilhador do México) viram reduzir a sua quota de bens industriais. China, Coreia do Sul, Formosa, México e Singapura representam quase 2/3 do valor de todas as exportações industriais do mundo subdesenvolvido.

Os porta-vozes do livre comércio receitam a todos que exportem mais e abram mais seus mercados, mas o fechamento dos seus mercados é a negação da retórica.

O lirismo da liberalização comercial espatifa-se contra o duplo critério que os países desenvolvidos aplicam no acesso aos seus mercados. Eles aplicam tarifas quatro vez mais altas às importações de manufacturas procedentes de países do Sul do que aquelas que aplicam a produtos semelhantes quando procedem de outros países desenvolvidos.

Os países mais pobres do mundo, os chamados "menos adiantados" são os mais castigados numa mostra suprema da racionalidade do livre comércio. As exportações desses 49 países mais pobres enfrentam tarifas 20% mais elevadas em média do que para o resto do mundo. Se se trata das poucas manufacturas que exportam, então as barreiras são 30% mais elevadas e perdem uns 2,9 mil milhões por ano pela elevada protecção nos Estados Unidos, na União Europeia, Japão e Canadá.

Os porta-vozes do livre comércio não podem ocultar a escandalosa realidade dos subsídios agrícolas. Não obstante, desde que principiou a Uruguay Round vêm prometendo que os reduzirão. Mas aconteceu exactamente o contrário: elevaram-nos.

Gastam em subsídios umas cinco vezes mais do que o destinado à Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (AOD).

Em outra amostra excelente da racionalidade do livre comércio, milhões e milhões de pequenos produtores agrícolas que recebem menos de 400 dólares por ano estão "competindo" com agricultores estadunidenses e europeus que recebem respectivamente uma média de 21 mil dólares e 16 mil dólares por ano como subsídio.

O resultado é outro buraco negro no prestígio do livre comércio: os Estados Unidos realizam mais de 50% das exportações mundiais de milho e fazem-no a preços uma quinta parte inferiores aos custos de produção. A União Europeia é o maior exportador mundial de açúcar branco e seus preços de exportação são uma quarta parte dos custos de produção.

Isto é, nem mais nem menos, que dumping , o qual é um anátema na retórica do livre comércio idílico. Mas a realidade é que, além disso, os vitimários acusam as vítimas. O proteccionismo do norte, em todas as suas manifestações tarifárias e não tarifárias, custa não menos de 100 mil milhões de dólares anuais ao Terceiro Mundo, isto é, o dobro da AOD e, não obstante, tanto os Estados Unidos como a União Europeia apresentaram à OMC entre 1995 e 2000 um total de 234 acusações de dumping contra países do Sul.

O discurso do livre comércio destaca o papel de vanguarda do comércio de serviços como cenário de progresso tecnológico e aposta de futuro.

Mas os únicos serviços realmente liberalizados foram os serviços financeiros, justamente ali onde a superioridade e a conveniência dos Estados Unidos são esmagadores. Outros serviços de especial interesse para os países do Sul, como os serviços na construção e outros, permanecem fechados.

Por desgraça, quase todo o Sul engoliu a pílula do livre comércio. Os porta-vozes da abertura comercial não podem acusar de rebeldia ou sequer de falta de cooperação boa parte dos governos dos países do sul nos anos do neoliberalismo em auge.

Seguindo as pregações do G-7 fizeram um desarmamento tarifário e, em geral, uma abertura comercial mais rápida e profunda que a realizada pelos próprios pais da proposta. Daí resultaram realidades tão absurdas que causariam riso se não tivessem um significado tão doloroso para os povos.

Dezasseis países a África subsahariana têm economias mais abertas que a dos Estados Unidos, mas não tiram o primeiro lugar à América Latina (insuperável discípula neoliberal) que tem 17 países nessa condição.

A liderança mundial é detida pelo Haiti. Reúne várias qualidades que revelam uma coerência impressionante. É o país mais pobre do hemisfério ocidental e um dos mais pobres do mundo. Sua pobreza é antológica, dolorosa e cruel.

Mas desde 1986 o Haiti alcançou o galardão como economia totalmente aberta, segundo classificação do FMI. Recebeu calorosos elogios pela sua exemplar vontade aberturista.

É um exemplo irrefutável de que a obediência ao modelo neoliberal de livre comércio é incapaz de resolver a pobreza e o subdesenvolvimento.

Livre comércio, como proposta de hoje para o Sul, é também investimento de capital em condições de especial benefício para as transnacionais, é compras do sector público manietadas e incapazes de actuar como impulsoras de desenvolvimento interno para respeitar o direito das transnacionais a dominar os mercados nacionais e é uma política de competição concebida para exterminar os chamados "monopólios oficiais" enquanto fecha os olhos perante os monopólios privados.

Para finalizar esta apresentação, surgem as interrogações quanto ao futuro. O sistema de comércio internacional pode ser reformado como comércio ou necessita mais do que uma reforma, uma profunda transformação substancial que torne realidade não simplesmente algo menos mau e sim o outro mundo possível e definitivamente melhor que aspiramos?

As reformas contidas nas reivindicações do Grupo dos 77 na OMC (o tratamento especial e diferenciado, o acesso a mercados, a eliminação de subsídios agrícolas, as mudanças para tentar compensar o desequilíbrio na actuação da OMC e outras) são justas porque pretendem enfrentar graves injustiças e merecem apoio frente à intransigência e à voracidade do G-7 e seus consórcios transnacionais. São também parciais e não atingem a profundidade necessária para alcançar a transformação de fundo.

Sua parcialidade consiste em que o comércio internacional não é mais que uma subsistema, uma peça de uma maquinaria total que é o sistema imperialista de dominação e exploração e que agora utiliza as peças financeiras e monetárias como os principais componentes para operar a dominação.

O avanço das reformas comerciais — no caso de avançarem — deixaria abertos múltiplos e amplos espaços pelos quais aquela dominação poderia continuar a existir. Pouco significado teria, como um exemplo entre outros, algum tratamento especial e diferenciado no comércio, se as taxas de câmbio flutuantes, a absoluta liberdade para dar fuga ao capital e a expoliação da dívida externa continuarem a chicotear os países subdesenvolvidos.

O sistema é isso: um sistema integrado e global e a resposta à sua actuação tem que ser global e integral, como o entende e é a razão de ser do Fórum Social Mundial e do Fórum Social das Américas.

Tentando olhar mais longe, em direcção ao mundo possível e melhor a construir, o comércio internacional não poder limitar-se a mitigar um tanto a liberalização.

Essa liberalização tem um código genético bem claro. É filha do mercado capitalista e não pode ocultar a sua vocação essencial para a exploração comercial que emana do intercâmbio desigual entre partes desiguais às quais os intercâmbio aparente de equivalentes apresenta como iguais.

O mundo melhor e possível, esse da utopia imprescindível que nos permite avançar, não necessita amenizar a liberalização e sim criar outro padrão de valores. Um padrão de valores no qual a solidariedade entre também no comércio, e impeça que este continue a ser o cenário descrito por Che Guevara da actuação da raposa livre entre galinhas livres.

Maio/2005

[*] Director do Centro de Investigaciones de la Economía Mundial (CIEM), Havana.

O original encontra-se em http://www.cubasocialista.cu/texto/cs0161.htm .

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

20/Jun/0

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