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Subject: 10. O processo de consciêncialização de classe...


Author:
Guilherme Statter
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Date Posted: 20/11/06 23:03:29
In reply to: Guilherme Statter 's message, "Um "inventário" das ideias de Marx e Engels - Ou a peregrinação continua..." on 14/11/06 10:55:01


10. Os trabalhadores assalariados – uma classe-em-si-mesma – tenderá a transformar-se no proletariado, uma classe-para-si-mesma.

É caso para dizer que aqui, nesta "tese", é que a "porca torce rabo"...
Em primeiro lugar, esta "tese" implica uma determinada teoria da motivação humana. Já vimos que para Marx e Engels, "em última análise" são as condições materiais de existências das sociedades que determinam as ideologias nelas prevalecentes. A conhecida estória da "superestrutura ser determinada pela estrutura". É também sabido que quer Marx quer Engels tinham consciência de que por sua vez a "superestrutura" pode acabar por influenciar e incluencia a marcha da evolução da estrutura ou base económica da sociedade.
Por exemplo, a forma como é efectivamente redistribuída a riqueza produzida, afecta de forma muito directa o ritmo de crescimento a acumulação do capital.
Mas voltando à questão da eventual transformação da massa originalmente "amorfa" e dispersa de "trabalhadores assalariados" numa orgânica social (uma "classe") designada por "proletariado".
A transformação de uma "classe-em-si-mesma" (mas que e por isso mesmo, não tem consciência disso, de que é uma classe...), numa "classe-para-si-mesma".
Ou seja, quais são os factores que levam à referida "tomada de consciência" (de classe...) ?
Não cabe aqui fazer uma revisão – por muito sucinta que fosse – das diversas teorias avançadas por diversos sociólogos relativamente ao conceito de classe e aos factores ou elementos que permitam a observadores externos situar determinadas pessoas ou grupos sociais nesta ou naquela classe. Ou ainda que elementos se considera que influenciam o auto-posicionamento da cada um de nós numa determinada classe.
Para efeitos desta breve "peregrinação" a que me meti serve apenas (e é mesmo a mais relevante para aquilo que quero argumentar) a ideia aliás avançada pelos clássicos de "factores objectivos" e "factores subjectivos".
No que diz respeito aos "factores objectivos", limito-me a indicar
(1) experiência de vida partilhada na participação no processo produtivo.
(2) nível de rendimento efectivamente recebido e sua relação com o "custo-de-vida"
(3) nível educacional atingido
No que diz respeito aos "factores subjectivos", indico:
(4) auto-percepção do nível relativo de rendimento e concomitante "nível de vida" (próprio e dos outros com quem cada um se relaciona)
(5) distância ao poder, em particular no que diz respeito ao controle do processo produtivo e
(6) grau de participação na re-distribuição da riqueza gerada no processo produtivo.
De todos estes factores aquele que me parece crucial para a formação da consciência de classe é o da
"experiência de vida partilhada na participação no processo produtivo". Aqui importa assinalar que a expressão "experiência de vida partilhada" implica necessariamente a vivência em comum dos mesmos tipos de problemas de vida produtiva (mas não só...).
Como Marx assinalava, referindo-se ao campesinato independente em França, os camponeses individuais e vivendo uns distanciados dos outros, teriam a mesma "coesão de classe" que um saco de batatas...
Ora acontece que já as primeira "manufacturas", que antecederam as "fábricas", tinham como característica fundamental o aglomerar de centenas ou milhares de trabalhadores num mesmo local de trabalho. Depois e fundamentalmente, quer por razões tecnológicas (em particular a localização e custo das fontes de energia) quer por razões do custo das primeiras "máquinas" (ou "grandes instalações fabris") consolidou-se e veio a durar décadas o modelo técnico de produção. Ao fim e ao cabo, resultado daquilo a que Marx chamou de "concentração" industrial.
Foi esse o tempo de Marx e Engels, tempo esse que se prolongou até muito recentemente. De acordo com as perspectivas históricas e técnicas mais relevantes para aquilo que cada autor pretendia ou se propunha caracterizar, este "modelo social de produção industrial" veio entretanto a receber designações tão variadas como "taylorismo" (no que diz respeito à estrutura própria de cada empresa industrial), "fordismo" (no que diz respeito ao "contrato social" que entretanto emergiu entre patronato e sindicatos), "toyotismo" (por inclusão de factores culturais específicos do Japão...).
Entre nós tivemos os chamados "grandes grupos" e a "cintura industrial" (como aliás aconteceu com quase todas as grandes cidades).
Desde o tempo de Marx e Engels até ao aparecimento das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação (de certa forma um novo "paradigma"...), o processo de consciencialização de classe (da tal "classe-em-si-mesma" para "classe-para-si-mesma") foi bastante regular.
Aqui é caso para dizer que a previsão de Marx estava correcta, mas datada, porque contingente no que diz respeito ao modelo social industrial prevalecente, o qual era (e será sempre) dependente das condições materiais disponíveis para o sistema produtivo (a tecnologia). Ou seja, e recorrendo até à primeira das "teses" ("em última análise a estrutura determina a superestrutura"...), temos que tendo havido, como houve, uma mudança radical na tecnologia disponível para os processos de produção, uma tal mudança tinha necessariamente que implicar uma mudança na "psicologia da população".
Ironias... Pelos vistos a dialéctica a provar que Marx tinha razão no curto e médio prazo (mesmo assim a sua previsão esteve certa durante muitas décadas...) mas que a muito longo prazo (cem anos depois?...) se veio a verificar que afinal o "seu" processo de consciencialização de classe sempre estava sujeito às circunstâncias da História.
Em todo o caso e entretanto, aquela mudança (de paradigma) está ainda em processo de evolução.
Voltando aos termos de referência de Marx, dir-se-á aqui que enquanto que no seu tempo havia coincidência ou coexistência entre os chamados "processo de ‘concentração’" e "processo de ‘centralização’", hoje, aquilo a que assistimos é a uma "desconcentração’" acelerada, acompanhada de um processo continuado e mesmo intensificado de "centralização".
Onde está escrito "desconcentração" pode também ler-se "deslocalização" e onde está escrito "centralização" pode também ler-se "aumento do controle central de múltiplas operações industriais e de serviços dispersas por todo o planeta".
Sendo que este "aumento do controle central" só se tornou possível com a emergência das NTIC’s.
O impacto do cruzamento destes dois processos sobre a formação, consolidação e/ou manutenção da "consciência de classe" por parte dos trabalhadores não podia ser mais negativo.

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11. A oportunidade para a revolução...Guilherme Statter21/11/06 16:14:59


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